Quando analisamos os filmes do Studio Ghibli, encontramos referências, mensagens e simbolismos em suas histórias, ainda mais falando de Hayao Miyazaki. Essas mensagens e simbolismos conseguimos então analisar no filme Castelo Animado, um dos filmes mais conhecidos do estúdio e um dos filmes favoritos do público.
O Castelo Animado, ou em japonês, Howl no Ugoku Shiro, é um filme de animação japonesa lançado em 2004. O filme foi dirigido por Hayao Miyazaki e foi baseado no livro Howl’s Moving Castle, da escritora inglesa Diana Wynne Jones. O filme ainda foi indicado para a categoria de Melhor Animação para o Oscar em 2006.
Assim, vamos analisar como são fortes os simbolismos no filme Castelo Animado, desde a situação da guerra, das críticas ligadas ao ambientalismo e do por que enaltecer principalmente a construção de personagem da protagonista Sophie no filme.
Enredo do filme “O Castelo Animado”
A história de Castelo Animado foca na protagonista Sophie, uma jovem que não possui ambições, só acredita que seu destino é manter a chapelaria da família. Sophie acaba encontrando um jovem feiticeiro loiro que a ajuda após ela ser importunada por alguns oficiais do exército.
O encontro dos dois acaba por atrair a atenção da Bruxa das Terras Abandonadas que lança em Sophie um feitiço que a transforma em uma idosa. Assim, Sophie decide sair de casa em busca de um modo de quebrar a maldição, procurando a Bruxa que lhe jogou o feitiço para desfazê-lo. Sophie acaba entrando no Castelo Animado, no intuito de passar a noite em um local seguro mas ela acaba encontrando o mesmo jovem que a ajudou anteriormente, Howl. Sophie então acaba trabalhando como faxineira para Howl.
Portanto, além de acompanhar a relação de Sophie com Howl e a procura dela de tirar o feitiço, vamos ver também conflitos entre dois reinos após o desaparecimento do príncipe de um dos reinos. Assim, Howl acaba convocado para lutar por seu rei e por sua antiga mestra, Madame Sulliman. No entanto, Howl não é alguém que aceita ordens facilmente, já que o mesmo possui seus ideais e segredos.
Simbolismos do filme
Analisando a guerra
Quando analisamos de uma forma geral os filmes de Miyazaki, sempre vamos encontrar alguns símbolos, seja de uma forma direita, ou mais indiretamente. Podemos encontrar em uma característica de algum personagem específico ou até no ambiente que se passa o filme. Assim, o que mais marca no filme Castelo Animado com certeza é a questão da guerra que os dois reinos estão vivenciando e que acabam influenciando na rotina de Sophie e Howl.
Começando logo no começo do filme, é mostrado a rotina de Sophie na chapelaria. Ao acompanhar, começamos a perceber uma certa movimentação de soldados na cidade, mas isso parece não afetar a rotina dos moradores. Também temos outras cenas no filme já mais impactantes, como dos moradores comemorando o começo da guerra. Podemos considerar uma certa alienação dos cidadãos sobre o conflito. Temos até a mãe de Sophie, que tem uma imagem ligada ao consumismo, que só se importa com as roupas e dinheiro que ela possui, deixando de lado a realidade que vive.
Abrangendo nossa análise para Miyazaki, podemos enxergar essa crítica da guerra, principalmente a questão consumista em outros filmes, como em A Viagem de Chihiro (2001) que já analisei aqui no Chimichangas. As mensagens de Miyazaki sobre a guerra é que a mesma, muitas vezes, pode acontecer por razões egoístas e desnecessárias. Na vida real, voltando a falar de Chihiro, podemos até citar que, na premiação do Oscar que o filme ganhou na categoria de Melhor Animação, de acordo com Miguel Serpa (2018), Miyazaki se recusou a comparecer justamente em protesto contra a guerra que acontecia no Iraque.
Voltando ao Castelo Animado, a crítica a guerra pode ser vista então na questão da alienação, já citada, como também é mostrado grandes tanques aviões e máquinas de guerra. Por mais que Miyazaki tenha essa admiração por aviões e que muitas vezes, esse ponto ganha destaque em seus filmes, como em Vidas ao Vento (2013), em Castelo Animado temos mais uma crítica ligada às nações em quererem esbanjar seu poderio militar como grandes máquinas.
Podemos analisar até o comportamento de Howl durante o segundo ato para o terceiro ato do filme. Vemos um personagem que detesta guerra mas o mesmo acaba sendo mudado por conta da guerra. Ele começa a atacar aviões, causando violência, o que choca muitas vezes Sophie. Essa mudança também está diretamente ligada a transformação dele que, quando ele chega no Castelo após cada batalha, ele acaba se transformando aos poucos em uma espécie de ave. Isso está diretamente ligada ao comportamento dele, onde o mesmo está fazendo algo que não acredita, que é praticar a violência. enaltecendo a guerra.
E mais uma cena que podemos citar, e que foi comentada no texto de Miguel Serpa (2018), é a cena da escada, onde Sophie idosa e a Bruxa das Terras Abandonadas passam minutos tentando subir a escada do castelo da Madame Sulliman. Por mais que seja uma cena que fique marcado pelo lado mais cômico, podemos ligar diretamente ao individualismo do Estado, que luta pelas próprios interesses e ignora o povo, ainda mais aqueles que necessitam de mais atenção.
Campo x Cidade
O tema sobre o ambientalismo é um dos que sempre aparece nos filmes do Studio Ghibli, inclusive nos filmes de Miyazaki. Já citei na minha análise do filme Meu Vizinho Totoro (1988) no site NSV Mundo Geek, filme também dirigido por Miyazaki que, o autor faz uma crítica em como os humanos podem influenciar a natureza. Seja em suas ações ou construções feitas para seu benefício.
Assim, muitas cenas do filme são passadas em um grande campo verde com o Castelo em movimento. O poder militar, com aviões e armas podem já trazer essa ideia de como o humano influencia, muitas vezes, negativamente a natureza. O Castelo também pode entrar em debate onde o mesmo, que é uma grande construção de ferro, passa caminhando pela natureza.
Por mais que o Castelo acaba “invadindo” o ambiente do campo, seus personagens parecem pensar diferente. Sophie é totalmente ligada a natureza, sempre buscando relaxar no campo quando precisa, encarando a paisagem.
Assim, uma cena que representa muito bem as máquinas invadindo o campo é a que Miguel Serpa (2018), cita em seu texto. Sophie e Howl estão em um campo de flores, com uma lagoa azul cristalina, admirando o local, mas um avião de guerra passa por cima deles, interrompendo o momento dos dois com a natureza, “representando toda a ameaça e escuridão que os humanos trazem consigo para o mundo, contrastando com a paz de espírito disponibilizada pela natureza.” (SERPA, 2018).
A construção de personagem
Por mais que tenhamos esses simbolismos citados acima, vale ressaltar a construção de personagem que Sophie apresenta durante o filme, podendo ser considerada uma das mais interessantes em relação a outros filmes do Studio Ghibli. Sempre acompanhamos personagens mais jovens, que precisam superar conflitos para conseguirem amadurecer e por fim mostrar que cresceram ao público, como em Chihiro, ou em O Serviço de Entregas da Kiki (1989).
Já no Castelo Animado, temos uma proposta diferente. Quando Sophie é transformada em idosa, temos uma protagonista velha, diferente dos outros filmes do Studio Ghibli. Não só Sophie, mas a Bruxa e Madame Sullivan, também idosas, têm uma certa posição de importância no filme, mostrando que podemos ter sim uma construção de personagem com mulheres idosas.
E essa mensagem é fortalecida em muitas cenas do filme, ainda mais no momento de troca de lado da Bruxa das Terras Abandonadas, que poderia ser a vilã principal do filme, mas acaba sendo uma aliada de Sophie e Howl. Abandonando mais uma vez maniqueísmo, onde todos podem ter um lado bom. Temos até também no final do filme, que Sophie consegue aos poucos voltar ao normal, mas permanece com os cabelos grisalhos, simbolizando os aprendizados de sua época de idosa e como ela leva para sua vida adiante.
Assim, Sophie só consegue achar felicidade e aquilo que gosta quando sai da cidade e se muda para o campo e para o Castelo Animado. Trazendo uma construção de personagem mesmo sendo uma personagem idosa.
Os ensinamentos de “O Castelo Animado”
Mais uma vez vemos um filme do Studio Ghibli cheio de significados e simbolismos que atinge, muitas vezes, diretamente o espectador. Em alguns filmes, o simbolismo pode ser mais ligado a cultura oriental, mas em Castelo Animado, com certeza Miyazaki trouxe essas mensagens de uma forma que conseguisse fazer críticas em um âmbito geral, para que todas as nações conseguissem entender a mensagem do filme.
O Castelo Animado, além de ser cheio de simbolismos, consegue trazer uma inovação na construção de personagem, em relação a outros filmes do Studio Ghibli, onde Miyazaki consegue desenvolver muito bem uma personagem idosa. E assim, juntando todos esses pontos citados, Miyazaki conseguiu produzir um dos melhores filmes do Studio Ghibli.